quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010
Piratas, Corsários, Bucaneiros e Flibusteiros em pleno Parque
Aqui junto um texto sobre uma das actividades de "enriquecimento curricular" dos meus tempos de Ciclo Preparatório na Escola.
Aos dez anos de idade (1972) qualquer jovem vive ainda num mundo em que a realidade se mistura com a ficção. Tudo é possível, mesmo tudo!
Transformar o lago do Parque no Mar das Caraíbas era a coisa mais simples para um "bando" de jovens alunos do ciclo preparatório da Escola Industrial e Comercial Rafael Bordalo Pinheiro. Nesse tempo não existiam Play-stations, videojogos e outras formas de entretenimento existentes na actualidade. Muitas das brincadeiras iniciavam-se com base em factos reais, dando largas à imaginação. As leituras dos livros, que se iam requisitar à Biblioteca existente no próprio Parque, foram sempre fonte de grande inspiração para muitas das brincadeiras passadas e vividas nessa época.
Transformar o lago do Parque em Mar das Caraíbas, após leitura de algumas das obras de Emilio Salgari como «O Corsário Negro», era coisa óbvia e simples. Apesar de ser mais dado a leituras do que às actividades físicas, de ser geralmente considerado o «menino bem comportado», não deixei de ser um dos Flibusteiros daquela época.
Entre outros, fui responsável pelos inúmeros Galeões Espanhóis afundados, cujos restos podem – certamente! – ser hoje encontrados nas profundezas das águas turvas do Lago, quais provas evidentes de que o Lago do Parque foi outrora o nosso grande Mar das Caraíbas.
Se bem recordo, a transformação do Lago do Parque em Mar das Caraíbas começava logo pelas manhãs, em trabalhos de alistamento das tripulações, preparação de munições e arrecadação das necessárias receitas para "comprar" os navios. Como sempre, a tarefa mais ingrata e difícil era conseguir entre todos o mínimo de 4 ou 5 escudos necessários para uma boa tarde de diversão, a remos, na imensidão desse nosso Mar das Caraíbas. Do total do dinheiro conseguido dependia em boa parte o número de vasos de guerra em contenda e… de preferência, não haveria de ficar nenhum fundeado no Porto. (Para quem não se lembre, os barcos em causa eram uns barcos pesados, de madeira e com leme. Enormes causadores de bolhas de água nas mãos após umas boas horas a remar).
Ao início era fácil conseguirmos alugar os barcos e praticar essas nossas brincadeiras, as quais cedo degeneraram em verdadeiras batalhas navais, com abalroamentos e abordagens arriscadas. Levávamos muito a sério estas nossas brincadeiras e seguíamos mais facilmente o que estava escrito nas obras do Emílio Salgari do que as instruções ou conselhos de um professor. Está bem de imaginar que após uma batalha mais acalorada, com direito a gritos de – Homem ao mar! Homem ao mar!
– fomos de imediato proibidos de praticar as nossas contendas neste Mar das Caraíbas. Nessa acalorada batalha naval, dois aventureiros que iam em pé num dos "navios" foram literalmente ao banho na sequência do desequilíbrio provocado por um abalroamento.
Contudo… Pirata, corsário ou flibusteiro que se preze, não se dá logo por vencido. Havia que encontrar o estratagema para ludibriar a proibição. Ora é nessa fase que o presente escriba destas aventuras assume um papel primordial juntamente com alguns companheiros bem comportados. Pelo nosso ar inocente, de bons meninos, era relativamente fácil convencer a alugarem-nos os "navios".
Chegados ao parque, o grosso da excursão ficava escondido na zona da biblioteca, partindo eu conjuntamente com mais uns colegas para o embarcadouro, acompanhados normalmente de umas quantas colegas, com as quais pretensamente passearíamos calmamente no lago do parque.
Alugados os barcos, para disfarçar, dávamos umas três ou quatro voltas ao mesmo passando pelo ancoradouro, tranquilizando desta forma quem nos vigiava. Entretanto como quem não quer a coisa, colocávamos vigias de atalaia na ponte do lago e noutros locais estratégicos que permitissem avisar antecipadamente qualquer movimento que nos apanhasse em flagrante.
Tudo a postos, rumávamos a terra, longe do campo de visão do guarda, saiam dos "navios" as miúdas e entravam as tripulações. Começavam então as manobras das nossas batalhas navais, as quais se transformaram em batalhas quase silenciosas. Para iludir a vigilância – porque imaginação era coisa que não faltava a alguns – arranjou-se um estratagema simples. Um dos navios não entrava nas batalhas e estava sempre a dar voltas ao lago, passando sistematicamente no ancoradouro e de forma a chamar atenção do guarda, o que incluía algumas pequenas traquinices para entreter o guarda com alguns avisos ou repreensões de pouca importância, mudando sempre o remador e as respectivas meninas que tinham entrado no barco com esse remador. Era o que hoje se chama um dois-em-um. Conseguíamos ultrapassar a proibição e garantir o apoio das meninas na marosca, pois – vá-se lá saber porquê! – elas adoravam passear de barco nas águas do lago.
Como devem estar recordados, os barcos eram todos iguais mas estavam identificados por números. Tudo correu bem até ao dia em que uma menina se esqueceu de discretamente tapar o número do barco e o guarda se apercebeu que o barco era o mesmo e apenas tinha mudado de tripulantes. Desconfiou, fomos flanqueados pelo lado do velho cinema e apanhados em flagrante delito sem salvação possível. Terminou nesse dia as nossas actividades de pirataria no mar das Caraíbas em que tínhamos com imaginação transformado o lago do parque.
José Brás Santos
Comentários:
Amigo Santos
Regalei-me a ler a sua descrição “Salgariana” das aventuras no lago e que simpaticamente me trouxe à memória aventuras idênticas, passadas 11 anos antes (1961). Nessa altura o mais difícil era conseguir obter os 25 tostões para a aquisição de uma “nau” e por outro lado as “batalhas navais” só podiam acontecer a coberto, da visão do guarda, pela “ilha da caveira”.
O Parque D. Carlos sempre foi propício a ser teatro de “Novos Mundos” e tomada de novos conhecimentos que, embora não curriculares, nos ajudaram a evoluir como pessoas e homens ávidos de aprender. Foi aí que, na rua existente nas traseiras do Museu Malhoa, deixei pelo chão pedaços de pele com carne e sangue à mistura, não falando de pano das calças, na aprendizagem da “nobre” arte de andar de bicicleta. Dominar estes “bicharocos” de duas rodas, ziguezagueantes e teimosos – no inicio nunca iam para o lado que queríamos, nem sequer em frente, em linha recta e direita – pois, não sei porquê, tomavam sempre “no olfacto”, uma ou outra árvore.
Foi graças a esta aprendizagem, após muitos tombos, amargos de boca, galos na cabeça e joelhos esfolados, - amargos de boca porque o meu pai não achava piada nenhuma ás calças rasgadas, vá-se lá saber porquê, porque os joelhos de mártir só lhe provocavam sorrisos de mofa, - mas, dizia eu, foi assim que consegui obter a licença camarária, tipo carta de condução, para poder rodar com a bicicleta nas ruas da aldeia.
Um destes “animais tontos e teimosos” que existia lá por casa, era grande e pesado, do tempo da guerra, e para me colocar na sua “garupa” tinha de subir para um dos bancos de pedra, existentes no largo da Estação, e daí sentar-me no selim, tomar o rumo e aí vai ele pedalando quando o pedal estava em cima porque quando estava em baixo não chegava lá com os pés.
A evolução foi rápida e já conseguia dominar o “bicho”, só com uma mão… olha, olha sem mãos… até que um belo dia, comendo um tomate, retalhado com a faca e sal nas ranhuras, como quem come uma maçã à dentada, gozando com o “bicho”, - vês “animal danado” sou eu que mando e tu apenas obedeces, - vou, em cheio de trombas contra o taipal de uma camioneta. Meio zonzo, esparramado no chão, a cara cheia de tomate esborrachado, desato a ofender o “bicho”, como se a culpa fosse dele e não minha.
Um abraço
A.Justiça........12-02-10
Conclusão (minha) e não da história...:
Uns malandros ...estes jovens desse tempo...!!!
Mas na realidade...quantas histórias destas, "arrumadas no armário das recordações"... à espera de "saltarem" do teclado para o ecran destas "maquinetas", que nesse tempo... nem sonhávamos...!!!
abraço
Maximino........12-02-2010
Fins de Maio " últimos anos da década de 50, dia lindo já com cheiro a verão, eu e um grupo de amigos da escola e do meu bairro lá fomos à pesca para a Foz do Arelho com as nossas canas de bambu, que eram apanhadas perto da Fabrica Bordalo Pinheiro em que as "chumbadas" eram apenas velas de carros que íamos pedir a quaisquer oficina mecânica. Ora nesse belo dia, ainda a meio do meio da tarde estávamos junto à "Aberta", que por sinal era muito mais a sul do que actualmente se encontra, quando uma leve brisa se começou a fazer sentir, talvez porque a maré baixa tinha tido o seu tempo e a maré alta já começava a fazer alguns remoinhos contrariando a corrente de água que à pouco corria livremente para o mar. Connosco estava um sujeito de Tomar habituado a pescar no Rio Nabão, peixe de água doce, mas que tinha tido umas dicas acerca da Foz e estava deslumbrado com os robalos que tinha apanhado e nós tão entusiasmados que estávamos a apanhar uns "gairentos".(peixe parecido com o robalo mas de qualidade inferior) que não notamos que o tal senhor se tivesse ido embora, talvez se tenha apercebido que o tempo se estava a modificar. Quem conhece aquela praia e a antiga posição da "Aberta" olhando para os lados da antiga FNAT, sobre esse morro umas nuvens negras avançavam velozmente no sentido terra-mar e o vento cada vez era mais forte e então nós com a nossa juventude lá corremos em direcção ao Hotel do Facho onde se recolhemos daquela tão repentina tempestade. E aqui começa a história, estória. verdadeira.
SENHOR DOS TEMPORAIS
Era um dia lindo de céu azul.....
De repente as nuvens... tornaram-se de um azul, azul cinzentas
Até que já se confundiam com o verde cinzento do mar
E de repente ondas gigantescas que se tornaram mais e mais barulhentas
Lembrando o épico mar das tormentas. ...O vento, raios de luz naquele escurecer de dia, era algo de amedrontar.
Ao longe naquela praia sobre a imensidão d'areia
Via-se alguém de humano, trôpego parecendo a caminhar
E até a própria espuma de uma cor prateada das ondas naquela maré cheia
Era tão forte que decerto aquela criatura iria levar
Por entre aqueles raios de luz, tão simultâneos
A mesma figura como que bradando aos céus se levantava
E então nós jovens num acto de coragem;... Espontâneos
E num impulso repentino de humildade, um de nós exclamava:
Temos de salvar aquela alma perdida no areal
É dever humano, não haverá em nós fraqueza nem tão pouco capricho
E então lá desatamos a correr, numa corrida infernal
Para salvarmos aquele ser, que afinal era apenas uns caniços e um grande saco de lixo
Pensamos que era o tal senhor de Tomar e que não se apercebesse do perigo da "Aberta",e que fosse apanhado na corrente. Ficou o gesto.
Os erros de escrita e ortográficos, passem por cima não reparem neles....
Chaves......13-02-2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário